quarta-feira, 24 de julho de 2013

Dia 24/07/2004 - Há nove anos!!

Capítulo V
 
À ESPERA DE UM FÍGADO
 
O fígado, esse tardava! O nosso filho estava em S.O.S., a
sua degradação era galopante e começámos a ter consciência do
que era “um estado terminal”. A Dra. Isabel mandou-nos fazer
um electroencefalograma, os resultados eram bons, mandou
fazer outra ecografia ao coração porque a última tinha detectado
qualquer coisa que depois não se chegou a confirmar! Era exame
aqui, exame acolá, a rotina era penosa e desgastante, quase
parecia que estávamos no interior de uma esfera de céu azul que
ia sendo consumida pelo escuro tenebroso da penumbra que a
envolvia, asfixiando-nos muito lentamente.
Quando, noite dentro, regressava a casa, dava por mim a
não querer ouvir as notícias, pois quase tinha medo que um
subconsciente diabólico desejasse que alguma desgraça
acontecesse, não queria saber se tinha ocorrido algum acidente,
não queria procurar eventuais dadores entre as vítimas fosse do
que fosse, era uma luta permanente entre sentimentos e
paradoxos e eu …“fugia” de tudo!
Durante o sono também era assaltado por sentimentos
contraditórios, mistos de confusões, fantasmas e por vezes
acordava desorientado.
 
39
 
A NOITE
A noite chega
Não pára na porta
Entra
Entra e senta-se à mesa
Deita no chão o casaco
Sobre a mesa, pousa os braços
E aguarda
Aguarda pelos esfomeados
Pelos perdidos
Pelos temerosos
E deixa correr as horas…
As horas da noite são longas
Os ponteiros derretem nos segundos
Os minutos são longos
A noite instala-se na sala,
No quarto, no mais
Recôndito ponto da mente
Escurece a esperança
Endurece a raiva
Enfraquece a coragem
Mina os projectos
40
De noite, a noite reina
Domina, dança e brinca
Brinca com as fragilidades
Goza com os medos
E amordaça a aurora
Um raio de luz estala o cenário
A noite levanta-se
Apanha o casaco, recolhe as horas
A Aurora geme, faz saltar a mordaça
A noite afasta-se
Suspira
Até mais logo
 
Lígia
Hospital Pediátrico de Coimbra
 
 

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